quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

Nietzsche, Entre as coisas que são; BH, 0200202013.

Entre as coisas que são talvez mais difíceis de compreender para um
Homem nobre está a vaidade: sentir-se-á tentado a negar sua existência
Mesmo onde, para outra espécie de homens, salta aos olhos.
O problema consiste em se representar seres que procuram fazer surgir
Boas opiniões em benefício dele, opiniões que eles realmente não têm -
Que ele portanto, não as "merece" - e que acabam por acreditar nelas.
Isso lhe parece, de uma parte, de tão mau gosto, tão irreverente para
Consigo mesmo, por outra parte, tão barroco e tão louco, que consideraria
De bom grado a vaidade como uma coisa excepcional e que põe em dúvida
Na maioria dos casos em que dela se fala.
Dirá, por exemplo:
"Posso me enganar sobre meu valor, mas posso pretender pelo menos que
Meu valor seja reconhecido pelos outros, como estimo - mas isso não é
Vaidade (poderá ser "presunção", ou na maioria dos casos aquilo que se
Chama "humildade" e também "modéstia")."
 - Ou dirá ainda:
"Posso, por diversas razões, me alegrar com o bom conceito que os outros
Têm de mim, talvez porque os respeito e os amo; e me alegro com todas as
Suas alegrias, talvez também porque sua opinião sublinha e reforça em mim
A fé em minha própria boa opinião, talvez porque o bom conceito de outrem,
Mesmo no caso em que não o compartilho, é no entanto útil para mim ou me
Promete tê-lo - mas rudo isso não é vaidade."
É somente forçando que o homem nobre acaba por compreender, com o apoio
Da história, que desde tempos imemoriais, em todas as classes populares
Dependentes, o homem comum não era senão aquele que passava por ser: -
Como não estava habituado a criar valores por si mesmo, não atribuía
Outro valor senão aquele que lhe emprestavam seus senhores (criar valores
É por excelência direito dos senhores).
Sem dúvida, é preciso atribuir a um prodigioso atavismo o fato de que o
Homem comum hoje ainda, espera que se tenha uma opinião dele, para se
Submeter a ela em seguida de modo instintivo; e se submete não só a uma
"Boa" opinião, mas também a uma opinião má e injusta (pense-se, por
Exemplo, na maior parte das apreciações de si que as mulheres piedosas
Aprendem de seu confessor e que em geral um cristão crente aprende de
Sua Igreja).
Hoje praticamente, em função da lenta marcha para frente da ordem democrática
(E de sua causa, a mistura de raças dominantes com escravas), a inclinação,
Outrora sólida e rara, de aplicar a si mesmo um valor próprio e de "pensar bem"
Sobre si mesmo, é cada vez mais encorajado e se desenvolve sempre mais; mas
Essa inclinação tem sempre contra ela uma tendência mais antiga, mais ampla,
Mais essencialmente vital e, no fenômeno da "vaidade", essa tendência  mais
Antiga vai subjugar a mais recente.
O vaidoso se alegra com todo bom conceito que se tem dele (independentemente
Do ponto de vista da utilidade dessa opinião, de seu caráter verdadeiro ou
Falso), como, por outro lado, sofre também com toda má opinião, pois se submete
A duas opiniões, se sente submetido por causa desse instinto de submissão de
Origem antiga que tem em si.
 - É o "escravo" no sangue dos vaidosos, um resíduo da astúcia do escravo,
E quantos elementos do "escravo" ainda subsistem na mulher, por exemplo! -
Que procuram desviar o bom conceito a seu respeito.
É ainda o escravo que se põe logo a se prosternar diante dessa opinião, como se
Não fosse ele que a tivesse provocado.
 - E repito, a vaidade é um atavismo.

Nenhum comentário:

Postar um comentário