domingo, 9 de junho de 2013

E sigo caturro com a minha pedra caturra; BH, 040102000; Publicado: BH, 090602013.

E sigo caturro com a minha pedra caturra,
Tosca e rotunda e obtusa;
Mãe da minha completa opacidade,
Mãe da minha falta de conexão,
Estrutura e articulação,
Mãe da minha perdição; e
Que me machuca os pés
E me lança ao chão,
Com um violento tropeção;
De onde mesmo guindaste de cais de porto,
Não consegue me levantar mais;
É o peso da consciência e do remorso,
O peso do arrependimento e da emoção,
Da falta da paz definitiva que estrutura o coração;
Quero um dia quando puder,
Livrar-me da agonia desta pedra casmurra,
Da angústia que ela causa;
E deixar como resultado uma saída,
Uma porta de emergência, ou válvula de escape,
Para as pessoas, ou seres que por ventura,
Tenham nas próprias almas, ou espíritos,
A mesma pedra que fecha, eternamente,
A entrada, ou a saída do sepulcro;
E no peito casmurro cravados os espinhos,
Tirados da coroa de Jesus Cristo;
Quero deixar como sentido, razão e noção,
O dia da minha soltura,
O dia da minha libertação,
De atingir o orgasmo da liberdade de verdade,
Atingir o gozo do prazer da realidade;
A driblar realmente e com sucesso,
O medo e a covardia como um craque,
Dribla com a bola os adversários,
Em um campo de futebol;
Tenho uma pedra dentro de mim,
Não é no fígado e não é nos rins,
É uma pedra assim de tão ruim,
De pior qualidade e de brilho fosco,
Que aperta e dói e sufoca;
A tirar o fôlego até dos vermes,
Que se alimentam dos meus restos;
A tirar até o brilho do amarelo,
Dos pus dos bichos dos meus despojos;
E é só por isto que quero morrer,
E é só por isto que chamo pela clemência da morte;
Porque já estou morto e incinerado,
Já estou morto e desconectado
E a morte não quer quem está morto;
A morte não gosta de morto e desplugado,
A morte não gosta de quem não existe
E não tem valor nem para as moscas,
Que evitam as minhas chagas, as minhas feridas;
A morte não quer quem não sabe
Valorizá-la na hora fatal;
E só poderia de verdade vencer,
Se obtivesse o contexto de saber,
Usar e usufruir da inteligência,
Se por ventura fosse registrada,
Alguma em mim enquanto é tempo;
Porém, inteligência não herdei
E inteligência não tenho,
Para deixar de legado e de herança,
Aos meus descendentes e semelhantes,
Primatas e contemporâneos;
E tenho que me contentar,
Só com o que tenho e o que sou:
Nada; só esta pedra atravessada
Na garganta, na goela e no gogó,
No pomo-de-adão do pescoço enlaçado,
Por corda de nó cego górdio onde se encontra,
Ainda retidos na ânsia de engolir,
Restos de comidas dos festins demoníacos
Das sobras das almas expulsas do paraíso,
Vômitos dos vermes que deram congestão,
Dos banquetes negros e terminais,
De inúmeros seres de hospitais,
Pavilhões de esperas infernais;
E acorrentados em lápides escuras e frias,
Ao ter um prato de comida fora
Do alcance da boca e da fome;
Não, não precisas acender a luz,
Minhas retinas já foram arrancadas;
Meus olhos já foram furados e a luz,
Já não faz nenhum efeito para mim,
A luz já não me é mais necessária;
Removas só um pouco esta pedra,
Deixas entrar um pouco mais de ar,
Depois puxas a pedra definitivamente;
Só esse segundo de ar me é suficiente,
Para me lembrar um pouco da vida
E para deixar escrito aqui,
Confesso que vivi um segundo;
Na negridão que carrego,
Confesso que existi um segundo ;
O restante foi todo calcinante,
Foi todo carregado no peso dos ombros, com a
Pedra e o lamaçal, nos quais me sepultei.(2)

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